sábado, 12 de setembro de 2015

MEU VIZINHO SURFISTA

  Olá, colegas. Estou com muitos artigos feitos pela metade, porém resolvi escrever esse breve texto. O tema não será sobre o Brasil e o fabuloso museu de grandes novidades ( a absurda ideia de uma intervenção militar), ou sobre a viagem, ou sobre a perda do grau de investimento. Não, o assunto hoje será sobre um ser humano com o qual eu tive o prazer de conviver por um ano.

  Antes de morar no meu atual imóvel, eu alugava uma casa. Eram na verdade quatro casas uma grudada na outra. Quando morei lá em 2008 na segunda casa, um surfista profissional morava na terceira casa, ou seja éramos vizinhos de parede. Ele tinha esposa e dois filhos, e não preciso dizer, devido ao fato de serem casas geminadas, que eu podia escutar o ritmo familiar dele se desenrolando durante o dia, indo desde o despertador tocando, passando pelo café da manhã das crianças, chegando com a volta da escola das mesmas e terminando com o barulho de televisão de algum programa. Hoje em dia, onde vivo eu não escuto absolutamente nada dos meus vizinhos, e o tamanho do imóvel é relativamente bem maior. Tempos ruins em 2008 então? Uma casa menor, ouvindo a vida dos vizinhos? Não, pelo contrário, foi um grande ano da minha vida, e esse surfista profissional possui a sua contribuição nisso.

   Quantas vezes eu não acordei com a animação dele se preparando para surfar. Quando ele levantava bem cedo feliz, sabia que tinha que vencer a preguiça e me preparar para ir surfar junto. E o privilégio de um surfista com habilidades limitadas ir surfar junto de um profissional que já tinha chegado ao WCT (para quem não sabe é como se fosse a UEFA Champions League do Surf, mal comparando. É a elite mundial do surf) e enfrentado lendas não só do surf em especial, mas como do esporte em geral, como Kelly Slater? Para mim era um grande prazer.
  

  Quem não está habituado com o mundo do surf, às vezes pode se surpreender com o grau de competitividade, e muitas vezes agressividade verbal e até mesmo física, que acontece entre os surfistas. Para a esmagadora maioria dos surfistas faz sentido dizer quem é “prego”, “Haole”, “Pro”, etc. Esse tipo de comportamento, em minha opinião é claro, estraga um pouco a experiência que é surfar, além de ser um pouco sem sentido. Se você não é um surfista profissional, se não ganha dinheiro com isso, que diferença faz se você é bom, ruim, tube rider, ou qualquer outra definição? Para mim a essência não só do surf, mas como da vida em geral, é a possibilidade de se fazer amigos e se divertir enquanto se tem saúde. A vida é muito melhor quando se tem amigos, e sempre é bom conhecer e interagir com novas pessoas. Entretanto, boa parte dos surfistas, e por que não dizer dos seres humanos, não pensa e age dessa forma. Logo, seria natural que um surfista como o meu vizinho se achasse o maioral, não desse bola para ninguém na água e desprezasse quem, como eu, se esforça para pegar algumas boas ondas.

   Entretanto, o meu vizinho era um surfista diferente. Ele não só fazia questão de dividir a experiência de surfar com outras pessoas, como ficava feliz e animado quando outros surfistas (eu incluso), que não chegavam nem próximo dele no nível de habilidade, acertavam alguma boa manobra ou pegavam uma boa onda. Lembro até hoje, passados quase sete anos, o meu vizinho vibrando com uma manobra boa que consegui fazer, boa para mim, pois para ele, pelo nível de surf dele, seria considerado uma manobra mais ou menos, mais para menos provavelmente. A alegria dele, naquele momento, não era forçada, não era falsa, era absolutamente genuína.  Isso para mim é uma característica notável que uma pessoa pode ter. Eu não me impressiono com dinheiro, fama, poder ou habilidades em algum esporte, principalmente quando tentam fazer disso alguma vantagem em relação a outras pessoas.  Essa minha característica intriga muitos . Se alguém me dizer que tem 800 milhões de dólares na conta, provavelmente eu responderia “e?”. Se alguém me dissesse que é um baita de um surfista, provavelmente eu responderia “e?”. Se alguém me dissesse que é um político poderoso, provavelmente eu responderia “e?”. Essa, ainda bem, foi a criação que eu recebi dos meus pais de não dar importância para essas coisas ao se diferenciar seres humanos. Contudo, eu me impressiono quando vejo pessoas gentis, humildes e que possuem a bela qualidade de se comprazer com o prazer alheio, principalmente num mundo onde relações agressivas parece ser infelizmente a tônica. Se a pessoa consegue agir dessa maneira num campo onde é muito melhor do que a esmagadora maioria, o meu espanto e admiração aumentam exponencialmente.

   Assim, conviver por um ano com uma pessoa tão humilde e alegre foi o verdadeiro privilégio para mim. Com o decorrer do tempo, o fato de ele ser um surfista tão bom virou apenas um detalhe, já que conviver com alguém tão bacana era muito mais importante. O meu contato com ele foi de apenas um ano. Logo, não posso afirmar se ele tomou decisões financeiras acertadas ou não na vida. Não posso afirmar se ele por ventura não possa ter tido atitudes ruins com outros humanos na vida. Aliás, creio que nem sobre mim mesmo eu posso fazer juízos categóricos, quanto menos de uma pessoa que convivi por tão pouco tempo. Porém, eu posso afirmar que no ano que eu convivi com esse surfista, ele não me ensinou habilidades especiais para o surf (talvez eu tenha evoluído um pouco olhando ele surfar tantas vezes), mas com certeza me fez refletir e sentir que é muito bom conviver com pessoas alegres e humildes. 

   O nome dele é Fabio Carlos da Silva, ou como era conhecido na região “O Fabinho”. Infelizmente, ele se encontra com problemas de saúde e não possui condições financeiras suficientes para fazer frente aos custos altos que a medicina moderna hoje impõe. A esposa dele, uma ótima pessoa também, pede ajuda financeira para que sejam feitos exames e comprados remédios. Como sei que há alguns surfistas que frequentam esse espaço, fica aqui a oportunidade para poder ajudar um dos grandes nomes do surf nacional, que com certeza pavimentou e ajudou que toda essa nova geração de surfistas brasileiros, também conhecidos como Brazilian Storm, pudesse existir. 

   Quem me conhece sabe que procuro tratar de temais mais gerais, abstratos e filosóficos. Entretanto, ao ver a foto do Fabinho acamado esperando ser atendido num hospital público realmente fiquei bem triste, principalmente porque ele é ainda muito jovem. Se alguém puder ajudar, ajude. Se não puder ajudar, não ajude. Há tantas organizações, tantos problemas no mundo, que eu não gosto de taxar pessoas que por ventura não se interesse por causas pessoais ou humanitárias. Cada pessoa tem o seu jeito próprio de ver o mundo, e a generosidade deve ser algo espontâneo, não imposto ou coagido. Entretanto, a generosidade, que obviamente não precisa ser apenas financeira - quantas pessoas generosas eu conheço que não necessariamente contribuem para alguma causa, mas no jeito de ser com outras pessoas mostram uma grande evolução enquanto seres humanos - é algo que faz bem para quem recebe, mas principalmente para quem pratica.  Seja com o Fabinho, seja com a maravilhosa organização Médico sem Fronteiras, com a escola de sua esquina, ou qualquer outra pessoa ou instituição, procure praticar um pouco de generosidade, faz muito bem.

   É isso colegas. Ao Fabinho e a sua família eu só posso desejar o melhor. Estarei torcendo do outro lado do mundo por sua recuperação. Quem porventura quiser ajudar com alguma coisa, esses são os dados: CEF - Agência 1570 - Operação 13 - Conta Poupança 00036131-3 - Fabio Carlos da Silva - CPF - 461320403-82 (reportagem sobre a situação do Fabinho)


Pensei em colocar a triste foto do Fabinho acamado no corredor do hospital. Não, não é assim que eu lembro dele. Pensei então em colocar alguma foto dele dando alguma manobra forte. Não, também não é assim que eu lembro dele. Por fim, achei essa foto. É exatamente assim que eu lembro dele. Um sujeito sempre sorridente e gentil, uma energia muito bacana. Um dia ele me disse que gostaria de ensinar crianças a surfar no seu Estado do Ceará. Torço muito pela sua recuperação, amigo, para que não só possa ensinar surf para as crianças um dia, mas principalmente para que possa passar essa sua alegria e humildade para elas.



Abraço a todos!

12 comentários:


  1. Depender da saúde publica no Brasil é algo aflitante.

    De todo modo quero te parabenizar pela sua atitude em fazer este post...



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  2. Você morava no Ceará, Soul? Ouvi a história do Fábio na TV mesmo.

    Há uns anos atrás ajudei uma atleta EXTREMAMENTE talentosa, que simplesmente vivia na pobreza e várias vezes deixou de competir por falta de apoio (Tita Tavares), fazia até trabalhos manuais e bazar pra arrecadar dinheiro e viajar, dei 100 reais a ela numa praia quando a vi e ela ficou muito feliz, muito mesmo hehehe...vou me informar mais sobre o Fabio e ver como ajudar também.

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    1. Olá, amigo. O Fabinho morava em Santa Catarina. Aliás, muitos surfistas profissionais se mudam para Florianópolis. Pelas ondas, pela qualidade de vida. Onde eu moro, há vários surfistas profissionais, o Adriano “Minerinho" que está liderando o ranking mundial do Tour nesse ano, morava na mesma rua. Faz um tempo que eu não via o Fabinho, a última informação que tive é que ele tinha voltado ao Ceará, pois não estava conseguindo pagar o aluguel para morar em Santa Catarina. Não sabia disso da Tita Tavares, lembro que ela era uma grande promessa do surf feminino. Coisas da vida e bacana a sua atitude.

      Abraço!

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  3. ual, soul. me pegou de surpresa, não esperava ler algo do tipo na blogsfera hoje pela manhã.

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    1. Pois é, eu gosto de escrever sobre várias coisas por aqui. Ao ver a foto do Fabinho, resolvi escrever sobre o mesmo, pois realmente tive bons momentos naquela casa que vivi no ano de 2008.

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  4. Apenas um adendo. Enquanto eu vivo um pouco abaixo das minhas possibilidades justamente para poupar caso algo de errado, vejo inúmeros vivendo "una vida loca" ou "como se não houvesse o amanhã", incluindo jogadores de futebol, esportistas outros, atores de TV, "celebridades" do BBB, etc.

    Aí o óbvio acontece e eles um dia não tem nem o que comer, e então aparecem na mídia, etc. Desculpe, eu não ajudo gente assim.

    Tem muita gente boa, trabalhadora e que passa dificuldades apesar de tentarem poupar o minguado, lutam por não terem tido de verdade oportunidades. Esses são invisíveis, esses não aparecem na mídia, mas esses sim merecem meu respeito e auxílio.

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    1. Colega, eu entendo o seu ponto de vista, apesar de não concordar inteiramente com ele (ver meu comentário ao Guardião). Sim, não me refiro ao caso concreto comentado nesse artigo, é possível que na maioria dos casos melhores escolhas financeiras pudessem ser feitas. Entretanto, pelo outro lado, há o sofrimento humano e a nossa capacidade de mostrarmos compaixão. Se casos como esses não te comovem ou convencem, é fácil. Há várias outras situações que você pode ser generoso como crianças com câncer, refugiados infantis, ONGS que apoiam a educação em países obres como a “Room to Read”, etc. Em nenhum desses casos, podemos falar que o sofrimento humano advém de escolhas individuais equivocadas. Além do mais, eu concordo contigo que há uma multidão de pessoas “invisíveis" que sofrem silenciosamente. Se você se condói com essa situação e procura de alguma maneira ajudar, já é uma atitude esplêndida.

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  5. Boa tarde Soul.

    Louvável sua atitude. Em verdade não conheço nada desse esporte, mas tive uma curiosidade agora : o que houve com ele? E, nesse esporte atletas profissionais como ele ganham bem?

    Nossa saúde pública é vergonhosa. E por total culpa do governo. Temos profissionais muito bons que são responsabilizados de forma indevida por este governo irresponsável e descarado.

    Espero que seu amigo, assim como muitos que padecem nos nosocômios públicos, possa melhorar. E espero que os demais profissionais e todos nós possamos perceber que nas entrelinhas dessa história há uma provável história conjugada de falta de educação financeira.

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    1. Olá, Guardião! Pegando um pouco mais leve no ritmo profissional? :) Olha, o auge do Fabinho foi lá pelo ano de 1998, 1999. Nessa época, o surf ainda não tinha se transformado nesse big business, pelo menos não no Brasil. Logo, ele não deve ter ganho muito dinheiro. Um surfista como Medina, com patrocínios, propagandas, deve estar ganhando bem, mas ele é o atual campeão do mundo num esporte que não dá mostras que vai parar de crescer. Além do mais, olhe ao seu redor, e veja quantas pessoas usam surf wear. O que eu posso dizer dele, é que a família dele tinha hábitos simples. A esposa trabalhava numa confeitaria, eles não tinham carro, só andavam de bicicletas, os filhos estavam em colégio público e o aluguel era bancado pelo patrocinador. Portanto, não foi o caso de esbanjar dinheiro, pelo contrário.

      Sobre a sua assertiva de educação financeira, concordo. Não temos um povo educado financeiramente. É verdade, mas não creio que isso seja motivo para fecharmos os olhos para o sofrimento humano, mesmo que ocorra com pessoas que poderiam e deveriam ser mais precavidas. Essa talvez seja a grande diferença de ver o mundo que tenho em relação a certas pessoas . Eu concordo com eficiência, contenção de gastos estatais desnecessários, apoio ao pequeno empreendedor, etc, etc, mas eu creio que temos que ver a vida com mais generosidade, mesmo com pessoas que talvez não fizeram as melhores escolhas possíveis. Termos como “parasitas" para definir outros humanos (e sei que você não pensa e se comporta assim, pois nos “conhecemos" há mais de dois anos - o tempo passa - e nunca vi você se comportando com rancor) me causam uma profunda tristeza, pois para mim isso é fruto de pessoas que estão nutrindo relações doentias com si mesmas e com a comunidade humana como um todo.

      Além do mais, problemas de saúde podem literalmente falir uma pessoa. Pode ter certeza que os seus R$ 500.000,00 duramente conquistados poderiam virar pó em poucos meses se você, ou algum familiar muito próximo a você, passasse por algum problema sério de saúde e não tivesse nenhuma cobertura privada ou pública para o problema em específico. A medicina moderna hoje em dia é caríssima, e isso é um grande desafio para governos, indivíduos, empresas, e a sociedade como um todo.

      obs: parece que ele bateu a cabeça e teve um AVC leve.


      Abraço Amigo!

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  6. Olá Soul,

    Parabéns pelo seu blog. Continue nos presenteando com seus artigos.

    Passei para colocar o link da recuperação do Fábio.

    http://globoesporte.globo.com/ce/noticia/2016/02/ex-wct-surfista-cearense-supera-avc-e-reencontra-prancha-5-meses-depois.html

    Grande Abraço.

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    1. Obrigado pela informação, colega. Fico bem feliz mesmo.
      Abraço!

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